'Transfiguração', fotografia de Sócrates Magno Torres |
Imaginem um
quadro representando a divisão entre duas pessoas feita por um corte emaranhado de arame farpado. Arame farpado!
Entre o eu e o outro há tensões que tornam os laços, muitas vezes, impossíveis
de serem feitos. Sinto que a obra transmite a dor provocada pelas relações
humanas.
Eis que há
entre o eu e o outro alguma demarcação de até onde se pode ir. Um dos males da
civilização, dos entraves da felicidade: saber quando se pode atravessar ou
permitir que atravessem. Entre as farpas do eu e do outro há espaços que podem
ser feitos sem grandes arranhões.
Uma travessia
que se faz sem dor demonstra afinidade. Ou, então, uma aprendizagem na
convivência em que as diferenças foram superadas, uma soma. Outras vezes, o
adentrar pelos vazios do outro pode ter sido doloroso, causado alguns arranhões,
e ainda assim realizado um bom encontro.
Um bom
encontro acontece quando é possível atravessar os espaços sem grandes dores ou
sem “ultrapassar os limites” como se dizemos no cotidiano. É quando se descobre
um caminho entre o eu e o outro que se pode ir e vir com suavidade e graça. Aí,
nesse ponto, podemos dizer: amizade. Amigos são aqueles que se divertem entre
os vazios do outro, e preenchem sem invadir os centros nervosos do outro ou quando
esbarram neles não se cortam, porque há um cuidado e sintonia que permitem que
a travessia seja feita.
Eis que, na aparente paz do encontro, se percebe algo diferente. Não se sabe o que é, mas ocorreu. Trouxe tensão, mas, se soubermos ter paciência, não levará necessariamente ao fim.
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